segunda-feira, 17 de junho de 2013

O último dia


Por mais beijos salgados que lhe tenha dado, ainda penso que não me despedi dele.
Chegou o último dia. O dia da despedida, do adeus. O dia dos beijos intermináveis, das angústias antecipadas, da grande devastação e morte a entranharem-se por tudo o que são corações vivos e imundos de paixões inesquecíveis.
Tudo começou por um abraço. Um vasto e caloroso abraço, parecido à tranquilidade do oceano e ao brotar das flores na primavera. Foi um abraço tão indecifrável, tão interminável quanto o amor que sentimos um pelo outro. O meu coração batia por esperança, por uma paixão de perigo e de aventura que poderia alguma vez decifrar todos os porquês destes meus sonhos impossíveis.
E foi aquele abraço que me permitiu voltar a ver o passado, o presente e o futuro. Tudo o que ele sentiu, sente ou há de sentir. Vi a mágoa que lhe causei, as lágrimas que derramei. Vi os limites, uma vida desperdiçada por um desejo insaciável e indescritível de paixão e de novas emoções.
Oh... Sim. Aquele abraço permitiu-me decifrar os olhos cor de mar - de esperança e de saudade. Aqueles lábios que cheiravam a insanidade plena. Aquele desejo de mil e um céus de beijos constantes, de carinhos que ficam, de olhares entrelaçados pela vida que poderíamos ter tido.
Assim, depois da despedida, veio o adeus. Com um medo de tal modo fugaz, que se começaram a misturar as seivas e as paixões e os corações. Vivas e mortas, com medo e com audácia.
Aquele beijo que veio para ficar.
E assim se começaram a conjugar as mãos e os lábios e o sabor de uma falsa felicidade há tanto tempo pedida! Com esse veneno que mata, essa luz que transforma... E, sem sequer nos apercebermos, já os corpos furiosos de um destino frio e mesquinho se misturavam, lentamente, como se fosse a última vez que o pudessem fazer.
Acabara o tempo. Nesse mesmo dia, ele ia viajar para nunca mais voltar. Ia procurar um bom médico para mim.
Então, chegou a hora do "até amanhã". Beijámo-nos pela última vez à porta do elevador.
Foi um beijo tão longo e tão salgado. Encostei os meus lábios contra os dele, pressionei-os com tanta força que quase íamos caindo.
Enfim... já passaram vinte e quatro horas, quase um ano, mas continuo com a mesma saudade, todos os dias a escorrer pela cara que o cancro deformou. Agora, com poucos dias de tormento. Até chegar à paz, ao céu do seu olhar.

Dedicado ao Yegor.

Lia.

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