segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Avó


Neste mundo de inocentes sorrisos e de grandes emoções, vagueava eu, como um som, uma melodia – a ópera. Oh..... A ópera…

Maravilhada com o que ouvia, lia e relia os papeizinhos de agradecimento e as flores bonitas que ofereciam á minha avó: túlipas, gladíolos, papoilas… E o que ela gostava de papoilas! Sempre, ao anoitecer, contava-me as suas histórias, nos grandes palcos do Alentejo, no que ela cantava ao som do rio, nos veados, nos peixes e nas borboletas que ali passavam, nos au-au dos cães, e nos piu-piu dos pequenos pardais. Porém, em qualquer uma das histórias, cabia sempre á papoila o papel principal: era a estrela do musical. Nas histórias da minha avó, ela esvoaçava como o vento, dançava com o seu longo vestido vermelho nas ruelas do destino. Palpitava no coração da minha avó, como se fosse parte dele.
Bem, voltando á ópera de Berlim…. O que eu gostava da liberdade da harpa, sussurrando aos pássaros que ali poisavam para sonhar. O que eu gostava do murmúrio das teclas do piano, falando entre elas a conversa da melodia eterna. E a voz da minha avó! Divinal…. Magnífica… Celestial. Destacava-se de todas as outras. Era realmente uma das melhores vozes da música clássica. Já fomos a Paris, a Londres, a Viena de Áustria, a Veneza, a Milão…. E todos os reis e rainhas, aquelas grandes pessoas mergulhadas em ouro e jóias preciosas, convidavam a minha avó para as noites dos seus serões majestosos. Aquela foi uma das noites, em que, na grande ópera de Berlim se juntavam as mais conservadoras pessoas da sociedade. Não seria certamente qualquer um que conseguiria pagar um único bilhete para ouvir a voz sonhadora da minha avó! E a forma como ela cantava… Ela esperou e trabalhou tanto para ter o que tem agora… Preenchia-me o espírito e elevava-me a alma. Chorava, por vezes, por não conseguir cantar tão bem como ela, e pelo modo com que ela cantava! Emocionava tudo e todos. Oh, e quando ela cantou Patris Dominicus… Foi aí que ganhou o prémio de melhor cantora lírica da Europa. Eu estava lá, sempre a apoiá-la. Levava o meu pequeno violino, o meu pequeno tesouro, o qual estava a aprender a tocar á cerca de dois anos. Naquela altura, eu questionava a minha avó sobre muitas coisas. Questionava-a acerca da magia das estrelas. Perguntava-lhe se o piano tinha alma, se era um ser vivo como nós, pois era demasiado belo para ser apenas uma simples “coisa”. E lá ia eu, contente, sem nunca me cansar de ouvir a minha avó, a sua visão acerca de tudo, a sua alma triunfante e sonhadora. Os seus sonhos falavam mais alto do que qualquer coisa, do que qualquer outra força. E sempre foi por isso que ela conseguiu alcançar os seus objectivos, e será assim que ela continuará a sonhar e a concretizar os seus sonhos.
Era por isso que a admirava, que a adorava, e que ainda a adoro, a ela, e á sua voz. Uma voz onde bailavam os pincéis, as tintas de óleo de minha mãe, o palco das telas resplandecentes. E assim se sucedeu a ópera: uma pintura musical.

Lia.

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